Sonhos Lindos... Sonhamos...
Sonhos
e mais sonhos desfeitos. Sobre a simples cama de um beliche, restos de um
passado recente nos remetiam ao gosto amargo dos que ousaram desafiar a vida de
forma inexplicavelmente desnecessária e desrespeitosa. E naquele momento,
restou-nos apenas a incerteza de que nada seria como antes. Como nunca foi e
nunca será. Em vão, por toda casa, fragmentos de vidas vistos pela rotina.
Nossos passos caminhavam ao acaso, pelo descaso de nossas retinas viciadas a
enxergar apenas o que compreendíamos como verdade e felicidade. Meio-dia:
guardamos na boca o sabor amargo do café servido durante a madrugada que fora a
mais longa de nossas vidas; a hora havia chegado... Na alma lembranças que
nunca se apagarão por completo. Triste e sombrio. Tampa branca de um caixão
sobre a cama, Cheiro forte de flor que insistia em expressar sua indignação,
rosto perfeito de anjo enfaixado para esconder a marca de um motivo que nos trouxe
a morte... Gritos... Muitos Gritos de dor... Nós que ficamos ouvíamos a cada
instante sem entendermos: “Leve-me para longe e perto de você. Leve-me agora
para nunca mais voltar!”. Eram Gritos de Mãe... Naquela hora pensei que
podíamos confortá-la... Éramos suas filhas... Mas Ela pedia aos Céus que a
levasse... Mas e nós!? Quem nos seguraria ao colo quando dele precisássemos!?
Hoje, sendo mãe, posso entender sua dor... Entro em pânico diante de uma
simples febre de meu filho... Naquela hora, tudo era inexplicável... Por
prudência, muita coisa foi mudada... Colocaram-nos para ouvirmos algumas músicas
no intuito de esquecermos seu rosto – tudo que nos deixava em paz. Lembranças
que nos martelavam e nos deixavam sem chão para executar tarefas rotineiras e
comuns surgiam a cada instante em nossas mentes; como por exemplo, varrer e
limpar os pequenos cômodos que juntos brincávamos. Sem fôlego, com dor e
saudade latente, atravessamos em longos pensamentos os dias incertos, a pensar
sobre os caminhos bifurcados que nos rodeavam a partir daquele acontecimento
fatídico. Se fosse diferente, horas, diferentes seriam. Mas, a MORTE havia se
tornado nossa verdade; ela era a nossa mais pura e dura realidade... Nada mais
duvidoso que os dias que se seguem depois dos temporais. Vida e morte; luz e
escuridão; céu e inferno. Trajetos opostos, vidas cortadas ao meio e o medo de
reinventar o futuro com gestos do passado. Por todos os lados, suas
brincadeiras de anjo, sua voz e seus olhos nos acompanhavam a nos torturar. Com
muita dor e saudade, ficaram-nos apenas lágrimas condensadas em restos de
esperanças projetadas... Restou-nos uma paisagem tatuada na alma que nos queimou
como chaga por longos anos incessantemente... Esquecemos as músicas de roda que
juntos cantamos, os versos aprendidos na escola que juntos versamos, os pecados
e as redenções que vivemos inocentemente... Nossos passos pareciam ancorados no
passado... Nossa esperança de um futuro melhor!? Como!? Minha mãe havia perdido
seu único e precioso menino... Meu Pai havia perdido seu único e certo
companheiro de jornada... A Esperança!?
Pelo jeito encontrava-se estampada em letras garrafais e cores enigmáticas. Em
negrito, vi seu lindo nome grafado em muros espalhados pela cidade que havia se
pintado de cinza. Sobre o mundo, uma breve lucidez deu vazão à insanidade
imposta pelos padrões esquecidos e o gelo do inverno latente pelas palavras
esculpidas em bolas de neve. Em cima dos enganos tardios, a novidade consumia
litros de saudade. O criminoso seria punido... Para quê!? Gesto que surgia como
pontes destruídas e malas desfeitas... As malas dos lindos passeios que
faríamos juntos... As malas que nos conduziriam aos cansativos concursos de
vestibulares... Depois à mudança certa... Você seria um excelente estudante...
Tudo levava a crermos... Eu estaria ali lhe ajudando... Fazia parte de nossos
inocentes planos... Não pude tê-lo ao meu lado... Nos meus concursos... Nas
minhas provas... Como em tudo que eu estaria com você... Mas, agora, em meu
pensar, você corre livre em verdes campos cobertos de Lavandas... Anjos nascem e
não Morrem... Surgem em meio ao lilás e azul mais perfumado da face da Terra...
Surgem do escuro abstrato das palavras em chamas para trazer a paz e a doçura
dos céus... Que trazem em meio ao vento
quentes e vivos versos de esperança como uma brisa matutina em dias de verão...
E foi assim... Em um dia ensolarado, fresco e perfumado digno de um lindo dia
de primavera... Que Brilhantemente você nasceu... Nasceu em um dia bem mais iluminado
que o de hoje... Era 21 de outubro de 1971... O sorriso de um anjo menino abria
o Largo sorriso de uma Mãe... A Esperança de um Pai... Os sonhos de uma
família... A Fé de uma vovó em acender as chamas que ainda a faziam visualizar
as perspectivas de dias melhores... Hoje
continuo sem entender porque precisou partir tão cedo... Mas prefiro me ligar à
sua Chegada... Cheia de Luz... Ela me reporta à Vida... À Esperança... À Fé...
Que Preciso ter para conduzir meu o meu anjo menino que como você me veio dos
Céus... Para a Vida aqui na Terra Alegrar... Você sabe meu irmão o quanto está
vivo em meu coração... Em minhas memórias... Em minha Alma! Inverti a ordem dos
acontecimentos – é fato. Quero que a SUA LEMBRANÇA VIVA permaneça cada vez mais
viva em minhas emoções... Amar-lhe-ei pela Eternidade!
Cleide
Arantes.
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