Como Cuidamos da nossa História!?
A um mês do natal lembro-me de Vira – completa hoje um ano e
seis meses que ela partiu... Antes de sua viagem rumo à Terra Prometida, tratou
logo de Cuidar do local onde seriam “depositados” seus restos mortais (como
dizem os homens) – incrível a Visão daquela Mulher Guerreira! Como seria bom se os políticos de sua cidade
tivessem um pouquinho que fosse de sua Nata Sabedoria! Como seria bom que “Os
prefeitos que por ali passaram em comum união à sua comunidade” já tivessem visualizado
“O cemitério como um símbolo” e não apenas como um depósito de corpos. Como é o
da Sua Cidade, no Interior de Pernambuco – por mais que se leia nas Escrituras:
“Deixem que os Mortos sepultem seus mortos” – Sabe-se que Nele está guardada
nossa história, nossos genes. E é lá que, às vezes, vamos para ter um contato
mais próximo, com aqueles que nos mostraram caminhos e dos quais gostaríamos
que ainda nos dessem algum sinal. Vira ainda era viva quando lá fui e Procurei,
naquela estranha desorganizada e superlotada mistura de sepulturas, o tremular
das folhas de alguma árvore e, até quem sabe, o voo cadencioso do pássaro mensageiro, que pudesse me ofertar a resposta
esperada pela localização do túmulo de uma antiga amiga e sua mãe. Com muita
dificuldade e sem saber onde meus pés pisavam o encontrei – nenhuma inscrição
identificava que era lá realmente que se encontrava “a matéria que abrigou” a
Alma de minha Amiga nesta Vida Terrena. Só sabia que era ali, quem foi ao
sepultamento. Minha Amiga era uma Pernambucana Porreta! Pobre cidadã que viveu defendendo
as teses de seus candidatos e partidos... Onde eles estavam!? Se mortos!? Com
certeza, seus ossos também estavam a “tremer de tamanha indignação” diante
daquela lastimável situação. Mas e seus Amigos e Familiares!? Será que ainda
guardava em suas memórias Algo de Bom e Valioso prestado por aquela Criatura
abandonada à sorte de alguém que ali por perto se encontre para indicar onde “fora
depositado” o corpo físico que a acolheu!? Todo Cemitério já é triste, mas aquele, Meu
Deus! É Deprimente! Será que ninguém ali ainda parou para pensar que “Esse
Espaço Misterioso” funciona como ponte, que une o tangível com o desconhecido!?
É de lá, com a ajuda de uma inscrição, de uma foto, onde nosso olhar parte da
lápide e viaja, com os olhos, pelo tronco ascendente de uma folhagem, uma
árvore, um cipreste que nos conduz até uma nuvem, onde acreditamos encontrar o
pálido rosto que alimenta nossa saudade. Geralmente, ali, no meio do silêncio,
nos esforçamos para ouvir qualquer coisa que a brisa nos traga; por momentos é
um som seco proveniente de um crepitar de chamas de velas, ou do farfalhar de
folhas; em outros, sutilmente, somos capazes de perceber o “arranhadinho” que
um louva Deus (a Libélula), a cigarra, a lagartixa faz quando escala o caule de
uma plantinha. Cada instante das visitas realizadas deveria ser aproveitado
para decodificar símbolos, para entender a possível mensagem que nos espera,
cifrada no local. Por isso a paisagem também mereceria ser rica e não lúgubre;
deveria estar carregada de esperanças e não de tristezas; deveria sinalizar
presença e não desleixos e abandono. A melancolia nunca promete, apenas ancora
a nossa vontade de sermos felizes. Saindo dali, meu Deus... Quanta desilusão e
desesperança de que ainda vale a pena “viver com alegria ao lado de Amigos e
Familiares”; mas não poderia deixar me envolver e “ancorar” a minha vontade de
ir adiante à procura de realizar meus sonhos (pelo jeito bem diferente dos
costumeiros sonhos daquele povo) – que estavam “sempre a esperar pela boa
vontade” daqueles que diziam eleitos para administrar. Saí dali envenenada –
Nada podia fazer – meus dias ali estavam contados – Apenas um alento apossou de
minha alma ao me deparar com o sorriso de Vira (que já se encontrava doente) –
ela não dependeria de uma só viva Alma para Cuidar da preparação de seu Túmulo –
Ele já estava Cuidadosamente feito – Digno de Guardar a “Sua Caixa, O Seu
Suporte, Seus Duros Ossos que a ajudaram nas duras lidas da vida” – Seu Túmulo
esta prontinho e ela mesma o edificou. Há tão pouco tempo, no início deste mês,
eu, meu companheiro e meu filho fomos ao cemitério para reverenciarmos nossos
mortos. Na realidade sempre procuramos ir com a intenção de manter aceso nosso
vínculo. E sabemos que estas visitas também nos servem para avivar uma luz que
recusamos ver extinta porque, de algum modo, estamos sujeitos a ela –
precisamos aprender a “dialogar com a morte”, como diz Rubem Alves. Afinal,
Somos absolutamente dependentes da memória que, remanescentemente, nos mantêm
ligados àqueles que não estão mais entre nós fisicamente, que deixaram de
existir, mas, misticamente, estão aí guardados como enigmas, no meio de um
jardim com flores ou no meio de um emaranhado sem uma humana possível
explicação.
Cleide Arantes.
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