A OBSESSÃO PELO MELHOR
Sofremos demais pelo pouco que nos falta
E alegramo-nos pouco pelo muito que temos.
Shakespeare
Estamos obcecados com "o melhor". Não sei quando foi que
começou essa mania, mas hoje só queremos saber do "melhor". Tem que
ser o melhor computador, o melhor carro, o melhor emprego, a melhor dieta, a melhor
operadora de celular, o melhor tênis, o melhor vinho.
Bom não basta.
O ideal é ter o top de linha, aquele que deixa os outros pra trás e
que nos distingue, nos faz sentir importantes, porque, afinal, estamos com
"o melhor". Isso até que outro "melhor" apareça e é uma
questão de dias ou de horas até isso acontecer.
Novas marcas surgem a todo instante.
Novas possibilidades também. E o que era melhor, de repente, nos
parece superado, modesto, aquém do que podemos ter.
O que acontece, quando só queremos o melhor, é que passamos a viver
inquietos, numa espécie de insatisfação permanente, num eterno desassossego. Não
desfrutamos do que temos ou conquistamos, porque estamos de olho no que falta conquistar
ou ter.
Cada comercial na TV nos convence de que merecemos ter mais do que
temos.
Cada artigo que lemos nos faz imaginar que os outros (ah, os
outros...) estão vivendo melhor, comprando melhor, amando melhor, ganhando
melhores salários.
Aí a gente não relaxa, porque tem que correr atrás, de preferência com
o melhor tênis.
Não que a gente deva se acomodar ou se contentar sempre com menos. Mas
o menos, às vezes, é mais do que suficiente. Se não dirijo a 140, preciso
realmente de um carro com tanta potência?
Se gosto do que faço no meu trabalho, tenho que subir na empresa e
assumir o cargo de chefia que vai me matar de estresse porque é o melhor cargo
da empresa?
E aquela TV de não sei quantas polegadas que acabou com o espaço do
meu quarto?
O restaurante onde sinto saudades da comida de casa e vou porque tem o
"melhor chef"?
Aquele xampu que usei durante anos tem que ser aposentado porque agora
existe um melhor e dez vezes mais caro? O cabeleireiro do meu bairro tem mesmo
que ser trocado pelo "melhor cabeleireiro"? Tenho pensado no quanto
essa busca permanente do melhor tem nos deixados ansiosos e nos impedido de
desfrutar o "bom" que já temos.
A casa que é pequena, mas nos acolhe.
O emprego que não paga tão bem, mas nos enche de alegria.
A TV que está velha, mas nunca deu defeito.
O homem que tem defeitos (como nós), mas nos faz mais felizes do que
os homens "perfeitos". As férias que não vão ser na Europa, porque o
dinheiro não deu, mas vai me dar à chance de estar perto de quem amo...
O rosto que já não é jovem, mas carrega as marcas das histórias que me
constituem.
O corpo que já não é mais jovem, mas está vivo e sente prazer.
Será que a gente precisa mesmo de mais do que isso?
Ou será que isso já é o melhor e na busca do "melhor" a
gente nem percebeu?
Amei este texto desta jornalista Mineira, Leila Ferreira – que mesmo
tendo vários títulos – como, por exemplo, mestrado em
Letras e doutora em comunicação em Londres, fez opção viver uma vida mais simples, em Belo
Horizonte.
Cleide Arantes.
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