sábado, 3 de dezembro de 2011

ACONTECEU COM ARTHUR
Este monarca, jovem ainda, foi certa vez surpreendido e preso pelo soberano do reino vizinho enquanto caçava furtivamente em seus bosques. O captor poderia ter matado imediatamente o jovem rei, pois tal era o castigo para aqueles que violavam as leis da propriedade. Porém comoveram-no a puçá idade e a simpatia de Arthur, a quem prometeu o perdão se no prazo de um ano encontrasse uma reposta satisfatória a esta difícil pergunta: O que realmente quer uma mulher? Semelhante pergunta deixaria perplexo até o homem mais sábio, e ao jovem Arthur pareceu impossível responde-la. Contudo, tentar encontrar a resposta era melhor que morrer enforcado. De modo que regressou a seu reino e começou a interrogar as pessoas. Interrogou a rinha e a princesa, prostitutas e monges, ao sábio e ao bobo da corte. . . Em resumo, a todos. Mas ninguém lhe pode dar uma resposta convincente. Porém, todos os aconselharam a consultar a velha bruxa, pois somente ela saberia a resposta. O preço seria alto, já que a velha era famosa em todo o reino pelo preço que cobrava por seus serviços. Chegou ao último dia do prazo combinado e Arthur não teve alternativa senão consultar a feiticeira. Ela concordou em dar-lhe uma resposta satisfatória com a condição de que Arthur aceitasse o preço: ela queria casar-se com Gawain, o cavaleiro mais nobre da Távola Redonda e o mais íntimo amigo do rei. O jovem Arthur olhou aterrorizado a feiticeira: era corcunda e feíssima, tinha um só dente, exalava um odor nauseante e fazia ruídos obscenos. Nunca havia topado com criatura tão repugnante. Muito relutou ante a perspectiva de pedir a seu amigo de toda a vida que assumisse por ele esta carga terrível. Não obstante, ao inteirar-se do pacto proposto, Gawain afirmou que cumpri-lo não seria um sacrifício excessivo em troca da vida de seu companheiro e da preservação da Távola Redonda. Anunciou-se o casamento e a velha bruxa, com sua sabedoria infernal, cumpriu sua parte: O que quer realmente uma mulher? Quer ser soberana de sua própria vida – disse ela. Todos souberam de imediato que a feiticeira havia expressado uma grande verdade e que o Rei Arthur estaria salvo. Assim foi: ao ouvir a resposta, o monarca vizinho concedeu-lhe o perdão e a liberdade. Mas, que casamento foi aquele! A corte em peso assistiu a cerimônia e ninguém se sentiu mais dividido entre o alívio e a angústia que o próprio Arthur. Gawain mostrou-se gentil e respeitoso, como convinha a um cavaleiro da Távola Redonda mesmo naquela circunstância. A velha bruxa, por sua vez, comportou-se com seus piores modos, engolindo diretamente a comida do prato sem usar talheres, emitindo ruídos e odores espantosos. A corte de Arthur jamais experimentara semelhante clima de tensão, porém os presentes – com exceção da bruxa – mantiveram a cordialidade ao longo da cerimônia e do banquete de casamento. Coloquemos uma cortina discreta sobre a noite de núpcias e contentemo-nos em mencionar esse fato assombroso. Quando Gawain, já preparado para ir ao leito nupcial, aguardava que sua esposa se juntasse a ele, ela apareceu-lhe com o aspecto da donzela mais formosa que um homem desejaria ver. Gawain ficou estupefato e perguntou-lhe o que havia acontecido. A jovem respondeu que, como ele havia sido cortês com ela, retribuiria apresentando-se metade do tempo com seu aspecto horrível e a outra metade com seu aspecto atraente. E perguntou-lhe qual aparência ele preferia para o dia e qual preferia para a noite. Que pergunta cruel para um homem! Gawain se apressou em fazer ponderações. Queria ter durante o dia uma bela jovem para exibir aos seus amigos e durante a noite, na privacidade de sua alcova, uma bruxa espantosa? Ou preferia ter uma bruxa de dia e uma jovem nos momentos de intimidade de sua vida conjugal? O nobre Gawain respondeu que a deixaria escolher por si mesmo o que melhor lhe aprouvesse. Ao ouvir isso, ela anunciou que seria para ele uma formosa dama durante o dia e também à noite, porque ele a havia respeitado e permitido que fosse a dona de sua própria vida.
 Retirado do livro: “Você, o amor e eu” – Ismael Lago

  

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