quarta-feira, 12 de setembro de 2012


 
AINDA SOBRE O CASAMENTO


Faz muito tempo que não assisto a um casamento, e quando assisto não presto muita atenção naquilo que o padre fala porque aqueles que foram contratados para fazer o vídeo e o álbum de fotografias não deixam. Mas é assim mesmo. A cerimônia do casamento existe  só para ser filmada e fotografada. Quando os amigos fazem uma visita é hora de mostrar o álbum de fotografias e os vídeos. O que comprova que todos os casamentos são iguais. “Como a noiva estava linda!”  Todas as noivas são igualmente lindas. Disseram-me que num país do oriente ( as coisas estranhas só acontecem em países do oriente...) escolhem-se as damas de honra entre as moças mais feias – para que a beleza da noiva fique realçada. Nesse país, ser convidada para ser dama de honra é um desaforo. Divaguei. Disse tudo isso só para explicar que não estou certo das palavras tradicionais da liturgia. “Aquilo que Deus ajuntou não o separe o homem”: é isso? Se for, acho que está errado. O verbo está no imperativo. De acordo com a teologia católica: quem realiza o sacramento não é o padre. É o próprio Deus. Se é Deus que ajunta  está vedado aos homens desfazer o nó que Deus deu.  O fervor da igreja sobre a questão da indissolubilidade do casamento não é derivada  de um piedoso amor à família. O que está em jogo não é a família; é a igreja. Aceitar o divórcio é rejeitar  a teologia sacramental da Igreja, é rejeitar a própria igreja. Assim está proibido separar aquilo que Deus ajuntou, isto é, aquilo que a igreja ajuntou. Eu proponho, entretanto, que o verbo, ao invés de estar no modo imperativo, deve estar no modo indicativo: “Aquilo que Deus ajuntou não o separa o homem”. Assim, se separou, é porque Deus não ajuntou. Se Deus não ajuntou não há a menor razão para ficar junto.
Rubem Alves.


  

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